Muito se tem discutido sobre a possibilidade das incorporadoras cobrarem dos compromissários compradores, na entrega de um imóvel adquirido na planta, a correção monetária do período compreendido entre a data da assinatura do contrato e a entrega das chaves propriamente dita.
Primeiramente, devemos ter em mente aquilo que disciplina a lei 9.069/95, em seu artigo 28, §3º:
Art. 28. Nos contratos celebrados ou convertidos em REAL com cláusula de correção monetária por índices de preço ou por índice que reflita a variação ponderada dos custos dos insumos utilizados, a periodicidade de aplicação dessas cláusulas será anual.
(…)
§ 3º A periodicidade de que trata o caput deste artigo será contada a partir:
(…)
III – da contratação, no caso de obrigações contraídas após 1º de julho de 1994;
Dessa feita, de conformidade com o que disciplina o artigo acima colacionado, perfeitamente possível a cobrança da correção monetária, desde que seja com periodicidade de um ano, senão vejamos.
Na realidade, não vislumbramos aqui qualquer tentativa de enriquecimento ou ganho da incorporadora. O que se pretende é única e exclusivamente a reposição da moeda pela perda inflacionária, caracterizada pelo aumento no custo dos insumos, refletido no Índice Nacional da Construção Civil, utilizado para o cálculo.
Ou seja, representa nada mais do que a atualização da moeda tendo em vista a sua desvalorização acarretada pelo processo inflacionário. E, no caso da construção civil, a inflação do setor se faz representar pelo Índice Nacional da Construção Civil.
Tal entendimento é esboçado por Álvaro Villaça Azevedo, na obra Teoria Geral das Obrigações, 7ª edição, Editora RT, p. 266, assim leciona:
“Como a própria expressão denota, correção monetária é um corretivo, que tem por objeto manter atualizada, no tempo, em seu valor, determinada espécie de moeda.
Ou, como ministra Rubens Limongi França: ‘Correção monetária é, em suma, a atualização do valor real da moeda, tendo-se em vista a data do entabulamento do vínculo e da execução da prestação.’
Realmente, suponham que alguém venda um imóvel a outrem, pelo preço de duzentos mil reais, que deva ser pago, integralmente, um ano depois. No entabulamento deste negócio, ou seja, quando as partes realizaram dito contrato de compra e venda de imóvel, este valia os duzentos mil reais. Um ano após, na data da execução da prestação (pagamento do preço), imaginem, com a desvalorização monetária, o comprador, recebendo aquele preço, não poderia comprar imóvel igual ao que vendera, por valer este, nessa época, duzentos e oitenta mil reais. O que se assiste, no caso em tela, é a depreciação do valor pecuniário, pelo simples passar do tempo.
A correção monetária é, no caso citado, o instituto jurídico adequado para reequilibrar a mencionada relação obrigacional de venda e compra, que pressupõe o exato pagamento do valor (preço) do objeto comprado (coisa), com a concordância de vendedor e comprador, neste sentido (consentimento).“
Corroborando nosso entendimento o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já decidiu a respeito, considerando válida a cláusula que prevê cobrança do ajuste do valor da construção, no processo nº 543.254-4/3-00, conforme é o acórdão que pedimos a devida vênia para colacionar:
ILEGITIMIDADE PASSIVA – Compromisso de venda e compra – Responsabilidade inicial de duas empresas – Posterior alteração da condição em face formal distrato – Assunção, pela remanescente, de todos os encargos anteriormente assumidos – Regularidade – Ausência de demonstração, pelos contratantes compradores de riscos ou eventuais prejuízos decorrentes da alteração – Exclusão determinada – Sentença alterada – PRELIMINAR RECONHECIDA.
COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA – Bem imóvel – Aquisição mediante obtenção de crédito em financiamento – Regularidade das cláusulas no tocante ao negócio – Exigência de diferença apurada a envolver o custo da obra e o dinheiro obtido com o financiamento – Conhecimento amplo pelas partes – Abusividade não demonstrada – Possibilidade da contratação diante diversidade de custo da obra ao longo do período de financiamento – Objetividade e clareza de cláusula – Contratantes autores com bom nível de formação e conhecimento – Impossibilidade, ao depois da conclusão da obra, da indicação de dúvida – Previsão regular da exigência – Dívida apurada e existente – Crédito em prol da contratante vendedora – Ausência de crédito em prol dos contratantes compradores a afastar pretendida repetição de indébito – Ausência, por conseqüência, de fundamento para obtenção de indenização por danos materiais e por danos morais – Sentença reformada – Inversão do ônus da sucumbência – Fixação de honorária tendo em vista o valor atribuído em prol da causa – RECURSO PROVIDO.
Vale aqui ressaltar também que a incorporadora precisa necessariamente apresentar ao compromissário, na época oportuna, a planilha detalhada do cálculo da referida correção.
Sendo assim, perfeitamente admissível a cobrança de correção monetária nos compromissos de compra e venda de imóvel na planta.